12 de janeiro de 2012

Chico Xavier e Dercy Gonçalves




Sempre que me pedem para falar de Chico Xavier, meu pensamento é levado para sua modesta e acolhedora casa, em Uberaba, e eu me vejo na cozinha, onde a gente conversava tomando café de chaleira e saboreando o famoso bolo de fubá e o pão de queijo mineiro.
Quando Chico aceitou conversar comigo, sem microfones, para acertarmos nossa primeira entrevista, eu estava apreensivo e muito emocionado. Afinal, depois de muito lutar, eu havia conseguido chegar próximo daquele homem que, para mim, representava um desafio.
Chico me recebeu com seu sorriso doce e amigo e me disse: eu já estava esperando você!
Conversamos, só nos dois, das 10h00 até as 4h00 horas da manhã. De vez em quando, me servia bolo e café, que ele mesmo preparava.
No dia seguinte, fomos autorizados a gravar com Chico. Chegamos com nossa equipe da TV Tupi, composta por nove homens, um caminhão de externa, equipamentos que não acabavam mais, um emaranhado de fios, enfim, tudo o que hoje é substituído por um simples celular, para gravarmos nossa sonhada entrevista. Chico nos recebeu na Comunhão Espírita Cristã e, depois da sessão, nos concedeu nossa almejada entrevista.
A gravação durou aproximadamente duas horas e foi a primeira vez que Chico permitiu mostrá-lo psicografando.
A reportagem foi um sucesso!
Em 1971 convidei Chico para uma entrevista mais ousada, o Pinga-Fogo. Não sei o que me impulsionava a querer dar àquele homem a chance de se mostrar por inteiro, sem censura e sem preconceitos, em um programa que, até então, era direcionado somente para grandes personalidades do mundo político, científico, editorial, artístico, empresarial e etc.
Chico só aceitou depois de se consultar com Emmanuel, pois dizia que não tinha competência para enfrentar tal programa e temia macular a Doutrina [Espírita].
O programa foi cuidadosamente planejado; não queríamos passar a ideia de um programa espírita e procuramos ser imparciais. Por isso, convidamos entrevistadores de vários credos: ateus, evangélicos, espíritas e católicos.
Acredito que alguns até tinham a intenção de “desmascarar” Chico, mas ficaram surpresos com suas respostas, diria eu, iluminadas.
João de Scatimburgo, lider católico, autor de vários livros, foi o entrevistador que mais questionou Chico Xavier e saiu da entrevista dizendo: “Chico Xavier se mostrou um homem sereno, seguro e muito me impressionou”.
Chico não deixou nenhuma pergunta sem resposta e deixou os entrevistadores perplexos!
Em meu livro, Pinga-Fogo com Chico Xavier (Editora InterVidas), retratei os dois programas de 1971 na íntegra e coloquei notas explicativas para que os leitores não tenham dúvidas a respeito do programa de maior audiência de todos os tempos.
Minha convivência com Chico Xavier, durante mais de 30 anos, contarei em um próximo livro: algumas passagens dessa nossa amizade, a correspondência entre nós, os programas em que participamos juntos, cenas comoventes que presenciei, a relação de amizade entre o repórter e o médium mais respeitado de todos os tempos.
Mas posso antecipar aqui um episódio ocorrido quando Chico foi participar do programa de Dercy Gonçalves. Ele foi muito receoso porque, todos sabemos, Dercy encabulava seus convidados com seus palavrões, que eram sua marca registrada. O programa correu normalmente. Dercy procurou se controlar e até reverenciou a figura de Chico, mas não deixou de fazer uma ou outra galhofa. Ao retornarmos para casa, Chico me confidenciou: “Aquela mulher é muito engraçada, sabe que eu gostei dela? É uma das pessoas mais sinceras que conheci”.

Saulo Gomes

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