Recentemente, uma publicação em uma rede social nos chamou atenção ao trazer um dado importante: segundo pesquisa do Datafolha realizada em São Paulo, cerca de 10% dos espíritas migraram para o meio evangélico em 2024. O número, por si só, é expressivo, mas mais importante do que os números são as perguntas que a página fez:
“O que tem afastado tantas pessoas do
Espiritismo? Estaria faltando acolhimento em nossos centros? Temos oferecido
pouco aprofundamento doutrinário? Estaríamos sendo julgadores e excessivamente
rígidos? Ou será que estamos falhando na vivência real do Evangelho?”
Essas questões são válidas e merecem reflexão
sincera e desapegada de vaidades institucionais. Afinal, o Espiritismo, que se
apresenta como o Cristianismo redivivo, não pode se furtar ao
compromisso de se autoanalisar com honestidade. E essa análise começa por
reconhecer que nem todos os que frequentam casas espíritas, de fato,
compreenderam o espírito da doutrina que ali se estuda.
Muitos dos que se afastam talvez nunca tenham compreendido, de fato, a essência libertadora do Espiritismo. Estiveram presentes fisicamente, mas espiritualmente ainda estavam presos a estruturas religiosas antigas, marcadas pelo medo, pela culpa, pela punição e pela terceirização da responsabilidade.
Ao encontrarem em algumas seitas evangélicas
uma linguagem mais simples, um ambiente mais emocional e uma fé calcada em
promessas imediatistas, identificaram ali um terreno mais compatível com suas
expectativas religiosas — muitas vezes ainda ancoradas no Antigo Testamento e
na ideia de um Deus vingador e exclusivista. Não julgamos, apenas
constatamos uma realidade evolutiva: cada consciência está em seu tempo.
Vale ressaltar que quando mencionamos
“seitas evangélicas”, não nos referimos às diversas congregações
evangélicas sérias, nem aos nossos irmãos evangélicos sinceros que
verdadeiramente vivem os ensinamentos de Jesus. Pelo contrário, reconhecemos e
respeitamos o esforço de muitos em viver o Evangelho com amor e dedicação. A
crítica aqui se direciona a movimentos religiosos que se utilizam do nome de
Cristo para difundir o medo, a intolerância, a barganha espiritual e a
manipulação emocional.
O Espiritismo não se propõe a agradar conveniências. Ele nos chama à responsabilidade pessoal, afirmando, como disse Jesus: "A cada um segundo as suas obras" (Mateus 16:27). A doutrina espírita não oferece salvação fácil, tampouco perdão mágico. Ela convida à reforma íntima, ao autoencontro, à superação das próprias imperfeições.
Essa proposta é, para muitos, desconfortável. Requer estudo, esforço, vigilância e, sobretudo, humildade para reconhecer que o maior inimigo não está fora, mas dentro de nós. E isso exige maturidade espiritual.
Jesus, sabendo das limitações dos seus discípulos e do tempo necessário à compreensão das verdades espirituais, prometeu enviar um Consolador, segundo o Evangelho de João:
“Ainda tenho muito que vos dizer, mas vós não
o podeis suportar agora. Mas, quando vier aquele Espírito de verdade, ele vos
guiará em toda a verdade; porque não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que
tiver ouvido e vos anunciará o que há de vir.”
(João 16:12-13)
O Espiritismo é esse Consolador prometido.
Veio explicar, ampliar, recordar e vivificar os ensinamentos de Jesus. Veio nos
lembrar de que Deus é Amor e Justiça, e que somos todos filhos do mesmo Pai.
Veio nos tirar das sombras da superstição e nos reconduzir à luz da fé
raciocinada.
É preciso reconhecer que, se pessoas se afastam do Espiritismo por não se sentirem acolhidas, ou por não encontrarem respostas profundas, a responsabilidade é, em parte, nossa. Estamos, de fato, vivendo o Evangelho?
Nossas casas espíritas são ambientes de amor, escuta e caridade? Ou nos
tornamos rígidos, teóricos e frios?
O conhecimento doutrinário é fundamental, mas
se não vier acompanhado de vivência evangélica, ele se torna árido e
estéril. É necessário evangelizar o coração, não apenas o intelecto.
Não se trata de atrair multidões, mas de tocar
consciências. Não se trata de agradar, mas de transformar. E isso só é
possível pelo exemplo.
Contudo, o Espiritismo é uma doutrina de luz, mas essa luz só ilumina quando acendemos o próprio interior. Não devemos temer as perdas numéricas, mas refletir sobre o que estamos oferecendo — e como estamos oferecendo. O verdadeiro espírita se reconhece pelo esforço que faz para domar suas más inclinações.
Se queremos que o Espiritismo permaneça como
farol seguro, devemos torná-lo vivo em nossas atitudes. O Evangelho não se
prega apenas com palavras, mas com gestos.
Que o Consolador prometido continue nos
inspirando — e que nós sejamos dignos de levá-lo adiante com humildade, fé e
caridade.
Regih Silva
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