O tempo passou. E sabemos que muitas outras vítimas surgiram — nomes, rostos, histórias e sonhos interrompidos. E tudo isso aconteceu enquanto o país elegia um presidente que declarava publicamente frases como: “Ninguém gosta de homossexual, a gente suporta.” Não bastasse o silêncio, parte da sociedade passou a aplaudir esse tipo de pensamento. Semana passada, mais um caso me dilacerou por dentro: Fernando Vilaça da Silva, mais uma possível vítima da homofobia.
Diante de tudo isso, a pergunta ecoa: onde está o amor ao próximo? O que leva uma pessoa a odiar alguém apenas por sua orientação sexual? Será que esquecemos os ensinamentos do Cristo, que pediu para amarmos uns aos outros como Ele nos amou? A Doutrina Espírita, que tanto preza pelo amor e pela justiça divina, é clara ao condenar qualquer tipo de preconceito ou violência. A questão 886 de O Livro dos Espíritos define a caridade como benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros e perdão das ofensas. Não há exceções. A caridade verdadeira não escolhe gênero, cor, classe social ou orientação sexual.
Além disso, o Espiritismo nos ensina que o Espírito é eterno, não tem sexo fixo, e que a orientação afetiva de cada um pode ser reflexo de experiências profundas, resgates do passado, provas ou missões que envolvem o amor em suas mais diversas formas. Cada encarnação é uma oportunidade única para desenvolver sentimentos nobres, e a afetividade, inclusive a homoafetiva, é um caminho legítimo de aprendizado e evolução.
Chico Xavier, em sua emblemática participação no programa Pinga-Fogo, em 1971, foi questionado sobre os homossexuais. Sua resposta foi clara, firme e profundamente cristã. “O homossexualismo, tanto quanto a bissexualidade ou a assexualidade, são condições da alma humana. Não devem ser interpretados como fenômenos espantosos, como fenômenos atacáveis pelo ridículo da humanidade. Tanto quanto acontece com a maioria que desfruta de uma sexualidade dita normal, aqueles que são portadores de sentimentos de homossexualidade ou bissexualidade são dignos do nosso maior respeito. E acreditamos que o comportamento sexual na humanidade sofrerá, no futuro, revisões muito grandes...”
Emmanuel, por sua vez, no livro “Vida e Sexo”, dedica um capítulo inteiro à homossexualidade, onde afirma que esse tipo de expressão afetiva pode representar experiências regenerativas, resgates importantes e até missões espirituais. Não há ali qualquer traço de condenação. Há, sim, uma leitura espiritual elevada, acolhedora, que compreende a diversidade das formas do amor como parte da lei divina.
E não posso deixar de citar o médico e palestrante espírita Andrei Moreira, que tem sido uma das vozes mais amorosas e lúcidas do movimento espírita atual. Em seus livros e falas, ele nos ensina que ser homossexual não é falha moral, nem erro da criação, mas parte da trajetória do Espírito imortal, que vive muitas experiências encarnatórias, tanto masculinas quanto femininas, buscando desenvolver a afetividade e o amor em sua plenitude.
E, se ainda houver dúvida, basta olhar para a natureza, obra direta de Deus. Ela nos dá lições de tolerância e diversidade todos os dias. Hoje sabemos que centenas de espécies animais — como pinguins, golfinhos, cisnes, leões e girafas — também manifestam comportamentos homossexuais. A biologia não só reconhece esse fato, como mostra que isso é parte natural da vida. Se a natureza acolhe a diversidade, por que nós, seres dotados de razão e consciência espiritual, ainda nos permitimos odiar?
A homofobia mata. Mata sonhos, mata corpos, mata esperanças. Mas também fere quem a pratica, pois se distancia da lei maior, a Lei de Amor. Como espíritas, cristãos, ou simplesmente como seres humanos, somos chamados a agir com compaixão, a denunciar a injustiça, a acolher os que sofrem, e a jamais silenciar diante da barbárie.
Se não pudermos apagar a dor do passado, que ao menos sejamos voz ativa e firme para impedir que novas feridas se abram. Que nossas palavras, escolhas e silêncios não alimentem o ódio, mas promovam a cura. Que sejamos, dia após dia, instrumentos da paz, da justiça e do amor que o Cristo nos ensinou.
Como me assegurou o espírito Aldo Oliver, em uma frase que nunca mais esqueci:
“Onde há amor, não há pecado.”
Porque a ausência do amor, esta sim, é o mais profundo dos pecados.
Regih Silva